Você está vivendo a sombra dos seus pais?

Em um evento de empreendedorismo em que estive, ouvi um palestrante, um homem bem-sucedido e de meia-idade, criticar as gerações mais novas. Ele repetia aquele velho discurso saudosista:

“No meu tempo, os jovens eram mais esforçados, trabalhavam mais, tinham menos preguiça e não mediam esforços para alcançar o sucesso. Hoje, os jovens são fracos, choram por qualquer coisa, são preguiçosos e não sabem construir os próprios alicerces sem a ajuda dos pais.”

Esse tipo de discurso é onipresente. Está nas reuniões de negócios, em conversas casuais e até nos churrascos de família. É sempre a mesma valorização de um passado idealizado em detrimento de um presente supostamente inferior. O oposto também acontece: os mais jovens olham para seus pais e avós e os acusam de terem vivido de forma errada — com excesso de trabalho, relações artificiais e prioridades materialistas, como se nada além de saldo positivo na conta bancária tivesse valor.

Esse embate entre gerações não é novo. No final dos anos 1960 e 1970, os filhos de trabalhadores dedicados e “certinhos” tornaram-se hippies, abraçando uma vida de liberdade e contestação. Suas roupas, comportamentos e sexualidade passaram a expressar justamente tudo o que os pais rejeitavam. Cada lado, inevitavelmente, criticava o estilo de vida do outro.

A sombra dos seus pais: um reflexo da vida não vivida

Essa dinâmica de rejeição geracional não é aleatória. Na verdade, ela cumpre um papel importante no desenvolvimento psicológico. Para que uma pessoa se desenvolva de forma saudável, ela precisa se afastar das características predominantes das figuras parentais. Esse distanciamento é necessário para que o indivíduo construa sua própria identidade, rompendo com a posição infantil de dependência e se afirmando no mundo.

O curioso é que, muitas vezes, esse afastamento ocorre através de uma inversão: o jovem adota valores e comportamentos opostos aos dos pais. Esses valores contrários, no entanto, não são criados do nada. Eles nascem justamente daquilo que os pais reprimiram em suas próprias vidas — o que eles deixaram de lado em nome do que consideravam certo ou necessário para viver. Essas escolhas, essas vidas não vividas, tornam-se o que podemos chamar de sombra. A sombra é a parte da vida que foi relegada ao “se”: E se tivessem feito diferente? E se tivessem escolhido outros caminhos? Naturalmente, por ser oposta aos valores predominantes, essa sombra é desvalorizada e menosprezada. E aí surge o ciclo: os filhos tomam a sombra como referência, vivem aquilo que os pais reprimiram, mas, em algum momento, também rejeitam o que veio antes. Assim, a sombra persiste, atravessando gerações.

E agora? O que fazer com essa sombra?

Viver à sombra dos seus pais pode ser tanto uma etapa natural do desenvolvimento quanto uma armadilha silenciosa. Quando essa sombra é consciente, ela abre espaço para questionamentos profundos, permitindo que você reconheça as influências que o moldaram e faça escolhas alinhadas ao seu verdadeiro eu. No entanto, se esse processo ocorre de forma inconsciente, você pode se ver preso a um ciclo de rejeição ou repetição, sem compreender plenamente suas decisões.

Por isso, o verdadeiro desafio está em olhar para essa sombra com clareza: quais aspectos da sua vida são reflexo de influências externas e quais são genuinamente seus? Entender essas dinâmicas é o primeiro passo para uma escolha mais livre e autêntica. Afinal, é ao assumir a responsabilidade pelo que você aceita, rejeita ou transforma que você consegue criar um caminho verdadeiramente seu — sem negar o passado, mas também sem ser refém dele.

Então, a pergunta não é apenas se você vive à sombra dos seus pais, mas como você lida com isso. A resposta a essa questão pode ser o ponto de partida para uma desenvolvimento psicológico saudável, e porque não, um maior amadurecimento.

E você, sente que vive a sombra dos seus pais? Compartilhe nos comentários suas experiências e reflexões!